Gosto de olhar na face, nos olhos; gosto mais que tudo de sentir.
“Me dá’ prazer o inacabado, a procura da rima, da batida, do botequim, da liberdade mais rica de liberdade.
_ Portanto gosto de andar ao léu.
Gosto de sentir no rosto a violência do tapa dos ventos sem rumos,
De apreciar a beleza imóvel das esquinas de pedra.
Ficar horas a vaguear pelas ruas da cidade parece mesmo ser minha aptidão; sair a admirar; a perguntar; a responder e a me espantar, sem, sobretudo, me preocupar com o perder a hora ou o atrasar já estando atrasado.
_ Portanto insisto em gostar de andar ao léu.
Eu gosto das diferenças; eu gozo no estranho e bato histericamente palmas ao esquisito. Beleza recriada?
Vou por ai simplesmente, entretanto não vou simplesmente.
Se vou, vou com cuidado, vou imbuído de sutileza e tomado de paixão.
Se acaso me apetece ir, vou, porém voo fotografando, voo descobrindo e redescobrindo, voo aplaudindo, voo cantando.
_ Portanto sempre hei de andar ao léu.
No rosto dos transeuntes apressados e despercebidos se vê melancolia, se vê cansaço. Vinicius de Moraes então diria muito adequadamente: o cansaço do operário é o descanso amigo e arma do patrão, e eu não digo mais nada. E se não digo é porque calo, e se calo é por tristeza, e você cala por calar?
O que sei é que as noites daqui são frias e os dias se vão tão rápidos.
Ainda assim gosto de andar ao léu.
Antes de tomar o último ônibus, na última fila e último ponto, ainda tenho tempo de me jogar aos céus, e como num gesto de reverência, munido de meus velhos e coloridos pincéis, desenhar nas nuvens um rosto; um rosto inequívoco de mulher, talvez o rosto da moça de sorriso aberto.
Saulo Oliveira