quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Verbo Ausente


–Como saber se aquilo se tratava mesmo de uma rua? Somente dois postes a encobrir o vazio de suas calçadas e a nudez pobre de suas esquinas. Todo o resto era desprezo e esquecimento.
O vento que assoprava vinha das bandas da rodagem; era um vento morno, velho e cansado. – Um vento sem vontade de chegar à cara da gente...!
Aproximou-se da casa que supunha ser a que procurava, e ficou por um tempo, a observar o que parecia uma tentativa frustrada de uma pequena horta; apenas alguns pesinhos de mastruz e uma moita de erva-cidreira resistiam teimosamente sob a inclemência do sol. Hesitou por algum instante, suficiente para um mergulho em suas lembranças não muito recentes, e reviveu tudo que passara até chegar ali. Amargou ainda mais, ao constatar no que o tempo o transformou, e de que talvez não devesse nunca ter saído daquele canto, onde tudo já estava morto, sem que, no entanto, fosse enterrado.
Quando finalmente deu por si, uma lágrima despontava em seus olhos, e concluiu que era o que lhe restava para traduzir o turbilhão que vinha em seu fundo. Um carro passou rompendo aquele silêncio dramático, e o homem de dentro do veículo lhe acenou como que  o reconhecendo. Mesmo sem vontade, ele retribuiu o gesto.
As suas roupas estavam ensopadas, o calor fritava as dobras do seu pescoço e o sufocava. Viu-se sem alternativa, ­­– tinha de tomar uma decisão! Tomou para si um tanto daquele ar quente, como que pegando fôlego, e finalmente bateu com os gomos dos dedos suados contra a porta. Uma batida tímida, quase inaudível, que denunciava sua vontade de os de dentro ignorarem-no. Insistindo nas batidas, e vendo que eram inúteis, apelou para os gritos. Mas tudo continuava imóvel, mudo; cujo único ruído que se ouvia, era o grunhido de sua própria respiração, ofegante e sofrida.
Pelejou a esperar, com o estômago embolado pela ansiedade. Intrépido estancado frente à porta, – igual um “pé” de mandacaru, ostentando toda a formosura e dureza de seus espinhos.
O contentamento era crescente à medida que ia se convencendo de que ninguém viria atendê-lo.  Reparou que, como o vento, estava velho e cansado, e que, não valia mais à pena tentar.  Virou as costas sorrindo, – felicidade de covarde, – acho. Caminhou com pressa, e já no portão, lançou no ar sentença: – não havia mesmo nada a ser dito.

Saulo Oliveira


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