–Como saber se aquilo se
tratava mesmo de uma rua? Somente dois postes a encobrir o vazio de suas
calçadas e a nudez pobre de suas esquinas. Todo o resto era desprezo e
esquecimento.
O vento que assoprava vinha
das bandas da rodagem; era um vento morno, velho e cansado. – Um vento sem
vontade de chegar à cara da gente...!
Aproximou-se da casa que
supunha ser a que procurava, e ficou por um tempo, a observar o que parecia uma
tentativa frustrada de uma pequena horta; apenas alguns pesinhos de mastruz e
uma moita de erva-cidreira resistiam teimosamente sob a inclemência do sol.
Hesitou por algum instante, suficiente para um mergulho em suas lembranças não
muito recentes, e reviveu tudo que passara até chegar ali. Amargou ainda mais,
ao constatar no que o tempo o transformou, e de que talvez não devesse nunca
ter saído daquele canto, onde tudo já estava morto, sem que, no entanto, fosse
enterrado.
Quando finalmente deu por
si, uma lágrima despontava em seus olhos, e concluiu que era o que lhe restava
para traduzir o turbilhão que vinha em seu fundo. Um carro passou rompendo
aquele silêncio dramático, e o homem de dentro do veículo lhe acenou como
que o reconhecendo. Mesmo sem vontade,
ele retribuiu o gesto.
As suas roupas estavam
ensopadas, o calor fritava as dobras do seu pescoço e o sufocava. Viu-se sem
alternativa, – tinha de tomar uma decisão! Tomou para si um tanto daquele ar
quente, como que pegando fôlego, e finalmente bateu com os gomos dos dedos
suados contra a porta. Uma batida tímida, quase inaudível, que denunciava sua
vontade de os de dentro ignorarem-no. Insistindo nas batidas, e vendo que eram
inúteis, apelou para os gritos. Mas tudo continuava imóvel, mudo; cujo único ruído
que se ouvia, era o grunhido de sua própria respiração, ofegante e sofrida.
Pelejou a esperar, com o estômago
embolado pela ansiedade. Intrépido estancado frente à porta, – igual um “pé” de
mandacaru, ostentando toda a formosura e dureza de seus espinhos.
O contentamento era
crescente à medida que ia se convencendo de que
ninguém viria atendê-lo. Reparou que,
como o vento, estava velho e cansado, e que, não valia mais à pena tentar. Virou as costas sorrindo, – felicidade de
covarde, – acho. Caminhou com pressa, e já no portão, lançou no ar sentença: – não
havia mesmo nada a ser dito.
Saulo Oliveira
Como me deleito em seus textos! Brilhante!
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