sábado, 5 de janeiro de 2013

Só sei amar quando é de madrugada...

Foto: Teo Neto

No momento em que ouço o farfalhar solitário de folhas sobre o chão e o ruído dos cães vagabundos pela rua, fico mais leve, de riso fácil e um tanto mais menino.
A madrugada alta e onipresente, com seu muro de luzes opacas a reinar o mundo, é o que dá mais coragem e vigor para o dia que vem vindo. É nela que sinto o vento manso, fresco, quase frio, roçando ligeiramente a pele, e trazendo consigo coisas e medos (logo dissipados), muito distantes e antigos, que ficaram nalgum canto, e que, simplesmente, não se faz mais questão de serem lembrados.
É na madrugada alta e abafada, que me esgueiro por sobre a mureta do quintal, a fim de avistar a imensidão e o horizonte enigmático do sem fim, ansiando encontrar respostas para o amanhã, que virá muito provavelmente sem rodeios e abruptamente.
O que me consola é escutar o borbulhar da água, impaciente por ser tingida de negro, tomada pelo pó fresco de café, que depois de pronto, com seu cheiro forte e inebriante, ocupa cada espaço da casa, reclamando com urgência um cigarro.
A madrugada deve ser a parte do dia em que Deus trabalha. Deve ser ainda, o momento preferido de Deus, uma vez que é o preferido dos amantes.
Somente na madrugada, na madrugada alta e divina, é que deixo de ser macho e sou fêmea, para só assim, compreendê-la muito além do sexo. É lá, nas entranhas da madrugada, que eu me calo, e com o mais sincero interesse ouço e entendo o que ela diz. Verifico, com cuidado, o ritmo de sua respiração, enquanto dorme exausta. Vejo a beleza de sua alma, e me emociono com as marcas e o cansaço de seu corpo nu.
Penso que, a morte, o “fim” a que estamos todos predestinados, bem que podia ser uma bela e cativante madrugada, daquelas bem quentes, a nos esperar com sua larga e iminente alvorada.
De madrugada é quando minha mente insone descansa; de madrugada amo mais, e por conseqüência disto, é também quando estou e me sinto mais vivo.

Saulo Oliveira

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