sábado, 23 de fevereiro de 2013

A voz que vem de dentro...

Fora até o quintal e percebeu que havia uma luz que brilhava de maneira tão intensa, que não ousou descobrir do que se tratava; permaneceu onde estava somente a apreciar aquele fenômeno que não compreendia, mas achava bonito, e isto lhe bastava.
Na medida em que ia afundando em si, em suas memórias, em seus pensamentos, a luz do objeto mais forte e reluzente ficava. Experimentou por um tempo não pensar; ficar imóvel, mas seu corpo já se lhe mostrava incontrolável, e sua vertigem emocional crescia em profusão, como os rompantes da natureza.
Naquele momento ele era todo energia; puro brilho. Descobrira seu mais notável talento, que se constituía na tradução em prosa da realidade. Um dia, ele sabe que o que o aguarda lá na frente são as estradas. E é feliz por receber isto como resposta. Um mundo inteiro para ser redescoberto, relido; desvendado pela enésima vez, só que, do seu jeito, com a sua pele, seu suor, seu sangue.
Desiludir-se é o exercício que aprendera contra o que se põe definido. Não demorou muito para que soubesse não haver uma consciência antes da vivência, e que, é preciso gastar sola, e se colocar navegante sem norte desde sempre.
Apreciava tê-lo como interlocutor, para que assim pudesse se curtir, e ouvir o que ele tinha a falar a si mesmo – por mais que pareça absurdo, o ato de conduzir uma conversa consigo pode significar um grande avanço, desde que, haja suficiente sinceridade de ambas as partes. As horas iam rápidas, quando se encontrava em sua companhia. A conversa fluía e quase sempre convergia ao ponto que considerava o mais importante: aonde pretendia chegar. Achava desnecessário valorizar a origem. Sabia que a partida era o que menos importava; a chegada sim. A chegada não só é importante, como se faz importante, toda vez que no caminho pinta a dúvida da localização, ou a imprecisão na direção.
O pensamento lhe fervia sempre que imaginava a quantidade de asfalto que havia à frente a ser vencido. Os rumores que ouvira sobre a vida calma, e a possibilidade de viver de maneira pacífica, e suavizada pelo desejo da passagem indolor, o apavorava, e o fazia querer renunciar a seu modo rude de interpretar os signos que a vida lhe mandava.
Pobre menino que cria cegamente na força bruta. Que entendia a saída como um rompimento incontornável, talvez para não ter o incômodo de carregar o peso que uma alma pode significar em certa altura da rota. No instante em que soube da grandeza escondida sob o fracasso, não sob o puro e indigno fracasso, mas embaixo dos fracassos que poderiam ter sido admiráveis vitórias em campo.
O atalho pode ser uma escolha bem mais fácil e tolerável, uma vez que os ventos fortes – os que, nos fazem curvar diante da imensidão– se fazem presentes onde a jornada é conduzida em área aberta, com a exigência implacável do nosso fôlego ao limite.

Saulo Oliveira

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Despedida


Como foi bom...
... saber que se foi (...), e desta vez pra sempre!
Gostei da novidade de não ter mais seu perfume nos cantos da casa.
Sabe (...), foi bom! Apesar de tudo, foi bom. Mas passou. Como tudo!
Já não preciso mais te carregar comigo aos lugares a que vou; nem adormecer aos poucos rememorando o teu sorriso.
Finalmente me vejo livre do encargo que é planejar o futuro.
Até quando mesmo a gente achou que isso ia durar? Essa admiração à distância sem medidas; essa cumplicidade que beirava a loucura; a reciprocidade doentia nos gestos, nas letras, nos beijos, no pensamento.
Quanto maior a intensidade das chamas, mais rápido elas se vão.
Será que fomos tão imprudentes em não perceber que o que se dava era o encontro do fogo com o fogo? Que se tratando de dois astros de potência e arrebatamento tão similares, o desfecho não seria outro senão a distância?
Hoje que não sinto mais as suas chamas e que o seu calor já não me alcança, me comprazo no frio das noites escuras que me fazem livre.
Por isso (...), vá! E ao contrário do que diz aquela bonita canção de Oswaldo, não olhe para trás. Não seja tola. Não permita que a felicidade não a encontre, que eu de cá também o farei.

Saulo Oliveira

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Solidão a dois...

É estar sem estar
E ter os cabelos escorrendo em suas mãos sem o ter.
Num gesto de carinho se vai a atenção numa lembrança que, teimosa,
Insiste no que não pode, no que não é pra ser.
Essa solidão é rasteira, ela é sutil; essa solidão a dois, também vem acompanhada de vazio;
Sem que minha distração deixe de notar e perceber;
Pois essa solidão é tão solidão.
O hálito, o cheiro do corpo, os pés descalços pela casa;
A geladeira que se abre na altura da noite, e a camisa larga que se encontra com perfeição.
O certo é que não há certo! A vida, essa vida é um grande mistério, do qual saímos sempre sem antes desvendar.
Tempo não há para pensar, para desperdiçar, para ser sensato ou discreto.
Há a vontade!
No final, lá no finalzinho, quando nada for voz ou grito,
Quando tudo for gemido e suspiro,
Não terei vergonha em dizer que amo de madrugada,
Que amo amores impossíveis, irreais;
Que faço versos trançados com a minha própria dor,
E rejeito uma fórmula mágica de ser só um, de se encontrar em um.
Essa solidão a dois... Que não é pecado de tudo, que não é só luxúria,
Mas que, também é procura.

Saulo Oliveira

Do fundo do meu coração...